O governo federal apresentou ontem (22) uma medida provisória (MP) sobre a reforma do ensino médio. Para entrar em vigor, a MP deve ser aprovada em até 120 dias pela Câmara e pelo Senado.
Uma das principais mudanças é a chamada flexibilização do currículo, que passa a ser organizado por áreas do conhecimento. Hoje, ele contém 13 disciplinas obrigatórias e a previsão é que passe a ser dividido em linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica e profissional.
O ensino de geografia está incluso em ciências humanas, de acordo com a Base Nacional Comum Curricular, cujas discussões da segunda versão foram paralisadas pelo governo federal. O texto da MP define que o currículo será definido pela BNCC.
Estudante decide se quer continuar estudando Geografia
Parte do currículo será obrigatório e parte optativo, cabendo à BNCC definir os conteúdos comuns a todas as escolas, que não deverão ultrapassar 1.200 horas. A carga horária do Novo Ensino Médio foi ampliada para 1.400 horas.
O ensino de língua portuguesa e matemática será obrigatório nos três anos do ensino médio. O ensino de ciências humanas – e, por consequência, de geografia – será obrigatório a todos os alunos apenas na primeira metade do ensino médio. O mesmo acontece para as área de ciências da natureza.
Após concluir a primeira metade do currículo, o estudante poderá optar por se aprofundar em áreas específicas. Nesse momento, o ensino de geografia é optativo, pois depende da opção do estudante em continuar os estudos em ciências humanas.
Notório saber
A MP vai permitir que profissionais com notório saber, que seja reconhecido pelos respectivos sistemas de ensino, possam dar aulas de conteúdos de áreas afins à sua formação. Assim, não é mais necessário ter uma licenciatura na disciplina específica para dar aulas.
Essa medida contradiz as novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação Básica e ações que visam a valorização da carreira docente.
Dúvidas sobre sociologia e filosofia
Na primeira versão da MP divulgada pelo governo federal, sociologia e filosofia deixam de ser obrigatórias. No entanto, o próprio governo admitiu que divulgou uma versão errada da MP.
“Não está decretado o fim de nenhum conteúdo, de nenhuma disciplina. Do que a Base Nacional definir, todas elas serão obrigatórias. A diferença é que quando você faz as ênfases, você pode colocar somente os alunos que tenham interesse em seguir naquela área, explicou o secretário de Educação Básica do Ministério da Educação, Rossieli Soares.”
O ministro da Educação, Mendonça Filho, destacou que “na parte flexibilizada do currículo, o estudante que optar pelo aprofundamento e formação na área de ciências sociais e humanas, por exemplo, dedicará ainda mais tempo para os componentes curriculares como filosofia ou sociologia”.
Não está claro, portanto, se sociologia e filosofia foram excluídas como disciplinas obrigatórias na primeira metade do ensino médio. Ao que parece, é a BNCC que definirá se essas disciplinas serão parte do conteúdo obrigatório em ciências humanas.
O texto da MP abre uma brecha para o fim de disciplinas ao citar o ensino de língua portuguesa, inglês e matemática como obrigatórios nos três anos do Ensino Médio e colocar arte e educação física como componentes apenas da educação infantil e do ensino fundamental. Nesse caso, arte e educação física deixam de ser obrigatórios no ensino médio.
Críticas
A maneira como a reforma foi executada pelo governo federal, por meio de medida provisória e sem uma ampla e fundamental discussão com a sociedade, gerou muitas críticas por especialistas em educação.
Em entrevista ao UOL, Daniel Cara, coordenador-geral da CNDE (Campanha Nacional pelo Direito à Educação), considera preocupante a forma com que tudo isso está sendo feito.
“A MP é uma medida proveniente da ditadura militar, permite que o Poder Executivo seja um super legislador. Diante de governos frágeis e pouco preocupados em corresponder aos cidadãos, a MP como instrumento legislativo torna-se um perigo”, criticou.
No G1, Débora Cristina Jeffrey, coordenadora do curso de pedagogia da Unicamp, também discordou da reforma proposta pelo governo.
“Eu particularmente não concordo, ainda mais da forma como está sendo realizada, via medida provisória, desconsiderando a discussão que foi feita. É um caráter emergencial e irrevogável que vai ter consequência direta. Não compreendo. A partir do momento em que a lei vá ser aprovada por medida provisória, para depois ir para o Congresso, tem ingerência grande em todo o processo de discussão das últimas décadas no Brasil. Fizemos conferências, debates em torno do Plano Nacional de Educação, que acabou de ser promulgado, diretrizes para a formação de professores da educação básica, discussão da base curricular, que também não foi finalizada. Não é uma medida provisória que vai resolver. Existe um primeiro diagnóstico que aponta evasão e desinteresse dos estudantes, a própria pesquisa da geração ‘nem nem’ mostra isso. Não concordo. Ela pode trazer problemas muito sérios, em vez de melhorar, pode piorar. Você tem professores de química, física, como que isso vai resolvido? Como fica a relação com o governo federal? Ouviram secretários estaduais de educação, eles compreenderam como isso vai acontecer? Fere os princípios da LDB e da Constituição. Não é algo a ser resolvido com uma caneta. O processo de contratação dos docentes… Questões estruturais, políticas e de legislação que não têm sido consideradas. Estão criando outro problema. Não é com a caneta que isso se resolve. O que vai fazer com o tempo integral? É só um tempo para não ficar na rua? Há essas questões de fundo.”
O G1 entrevistou outros especialistas, que, no geral, dizem que as mudanças anunciadas pelo governo federal são ‘precoces’ e insuficientes para melhorar o ensino médio.
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